quinta-feira, 16 de abril de 2009

Anacronismo

Revezar -me na vida. Abandonar este meu posto por instantes. Partir. Ser outro sem a sensação de me corrigir. Antes como se nunca tivesse existido. Depois encontrar-me-ia a mim mesmo com o meu amor ao lado. Será que me reconheceria? Voltar-me-ia a apaixonar? A ventura de um enamoramento repetido sem o saber. Não como aqueles recomeços em Puna na esperança que as coisas voltassem ao que eram. Não voltam porque nunca o foram. Guarda-se o que se acredita ter vivido para sempre. Ter decidido não partir, cumprido o desejo de ser outro na tua Índia imaginária. A Índia de Jaya.
Os espíritos racionais não se podem dar ao luxo de viver atormentados por uma reminiscência trágica. Tenho toda uma vida para construir. Provar ao meu pai quem sou. Por que decidi seguir outro caminho. É tarde. A minha família é Florinda. Os meus filhos. Gostaria de ter alguém com quem desabafar numa caçada, após uma bebida forte, talvez numa saída clandestina com um cúmplice de ocasião. Vivo rodeado de gentios. Sofro todos os dias por não ter saudades da minha terra. Por ter medo de regressar e encontrar tudo o que não esperava ver.
A minha guerra é no outro lado de África. Numa terra de oportunidades para enterrar tudo. Os desabafos são uma magnificência proibida.
Esta noite sonhei em Concani. Já não falava a língua há demasiado tempo ainda que tenha sido sozinho.

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